Recenseamento agrícola, INE, 2009
Recenseamento agrícola de 2009, feito pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). Ver citações dos respectivos resumos mais abaixo.
[Este documento necessitaria de análise comparada e comentada, de preferência feita por um colaborador ligado à questão da soberania alimentar.]
Algumas observações imediatas:
- Parece evidente que o panorama agrícola português foi sondado pelo INE em função duma visão industrial, financeira e «desenvolvimentista» da agricultura. Resulta daqui um verdadeiro buraco negro no que se refere ao conhecimento e esclarecimento da realidade agrícola (social e cultural) de Portugal. As conclusões deste relatório parecem-nos por isso limitadas, estatísticas no pior sentido da palavra, e bastante inúteis.
- Aparentemente o INE entende a expressão «agricultor» ou «produtor agrícola» do ponto de vista da propriedade notarial das terras. Daí resulta a conclusão de que «o produtor agrícola tipo é homem» e tem 63 anos. Nesse caso cabe perguntar: o que são aquelas pessoas que passam o dia no campo, na sua maioria mulheres, geralmente familiares do dono da terra e co-proprietárias da mesma (de facto, senão de juris)?
- O relatório afirma que o «produtor agrícola» dispende em média 22 horas por semana nas actividades de exploração agrícola. Pressupõe-se que ou os organizadores do recenseamento nunca saíram da cidade ou estabeleceram um novo critério científico que estabelece: «exploração agrícola» = «ter os pés enfiados na lama», com exclusão de todas as outras actividades indispensáveis à lavoura.
- O relatório sublinha que o «produtor agrícola» médio «tem formação agrícola exclusivamente prática» – induzindo subtilmente a ideia de que esta falta de grau académico prejudica o próprio e estará talvez mesmo na origem da sua suposta falta de sucesso económico; ou seja, a agricultura industrial, não virada para a satisfação das necessidades alimentares, não seria predadora dos pequenos produtores, mas sim mais apta à sobrevivência económica.
- O relatório faz questão em sublinhar que o «produtor agrícola» não obtém rendimentos da terra, mas apenas de reformas. Por outras palavras, do ponto de vista do INE toda a produção agrícola que não se destine aos mercados dos grandes intermediários e praças comerciais é desprezável como elemento da economia local.
Feitas estas notas de precaução, aqui vai a citação do resumo do documento:
Resumo
O INE divulga os primeiros resultados do Recenseamento Agrícola 2009 (RA 09), comparando-os com a informação do Recenseamento Agrícola de 1999 (RGA 99). Trata-se da 2ª maior operação censitária realizada em Portugal, que envolveu uma equipa de 2100 colaboradores e um custo estimado de 16,9 milhões de euros.
As explorações agrícolas ainda ocupam metade da área geográfica do país. Contudo, nos últimos dez anos desapareceram 112 mil explorações e a respectiva superfície recuou mais de 450 mil hectares. A dimensão média das explorações agrícolas aumentou 2,5 hectares em termos de Superfície Agrícola Utilizada (SAU), situando-se em 11,9 hectares. Todavia, cerca de 75% das unidades produtivas ainda exploram menos de 5 hectares de SAU.
A paisagem agrícola alterou-se significativamente, reorientando-se para sistemas de produção extensivos: diminuíram as terras aráveis, aumentaram as pastagens permanentes, que já ocupam metade da SAU e reduziu-se o número de efectivos pecuários.
O retrato do agricultor típico reforça a importância social desta actividade, em que 80% do volume de trabalho agrícola é realizado pela mão-de-obra agrícola familiar. No entanto as empresas agrícolas, que representam apenas 2% do universo das explorações, são já responsáveis pela gestão de 25% da SAU.
Resumo 2
Caracterização do Produtor: o produtor agrícola tipo é homem, tem 63 anos, apenas completou o 1º ciclo do ensino básico, tem formação agrícola exclusivamente prática e trabalha nas actividades agrícolas da exploração cerca de 22 horas por semana. O seu agregado familiar é constituído por 3 indivíduos e o rendimento provém maioritariamente de pensões e reformas. […]Nas empresas agrícolas constata-se que:
- A dimensão média é de 142 hectares de SAU, 12 vezes superior à média nacional;
- A idade média do dirigente da exploração é de 50 anos, 12 anos mais novo do que a média nacional;
- Cerca de 40% dos seus dirigentes têm formação superior e destes, metade possuem habilitações específicas nas ciências agrárias;
- Empregam cerca de 30 mil trabalhadores, ou seja, 2/3 da mão-de-obra agrícola assalariada comocupação regular;
- Apenas utilizam 3,5 UTA por 100 hectares de SAU, enquanto que a média nacional se situa em 10 UTA por 100 hectares de SAU;
- A utilização dos tractores é mais eficiente, dado que, para explorar 100 hectares de SAU apenas é necessário 1 tractor, enquanto que em média são necessários 5 tractores.
Fontes e referências
Editado por Rui Viana Pereira.
INE.
Guardado no arquivo CADPP: Recenseamento Agrícola 2009 (pdf, 300KB).
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